sábado, 3 de setembro de 2011

In(desejadas) recordações


Há momentos na nossa vida, que o que mais nos motiva a viver, é pensarmos que uma coisa é certa: não voltaremos a sofrer o que já sofremos. Mas é nesses momentos que, instintivamente acontece algo que por mais que nós tentámos fazê-lo desaparecer, permanece. Às vezes, olhamos o céu com a preocupação única de encontrar uma estrela cadente que de facto nos torne imune às recordações, que por mais que tenhamos enterrado bem no fundo do nosso ser, por mais que tenhamos cavado anos e anos para encontrar um sítio de onde não possam sair, depois de eliminar-mos por todos os lados vestígios ou pequenos detalhes que possam permitir relembrar algo doloroso, estas conseguem encontrar nem que seja a mais fina abertura no nosso coração, a menos visível vontade de pensar no passado, o mais insignificante desejo de experimentar mais uma vez algo que por mais que nos magoe, é bom.
Quando mais penso que finalmente atingi a maturidade ideal para afastar as memórias, mais coisas acontecem que me fazem ver, que não é uma questão de maturidade. Ou quantas mais vezes defino auto-regras a mim mesma, de forma a evitar recitar sentimentos passados, mais me convenço que o que não quero sentir é de facto o que alimenta a minha existência, e que apenas a minha força prende o passado para deixar viver o presente.
Mas é quando esse passado se solta, raramente, e tende a encher-me de ansiedade e vontade de voltar ao que era, de voltar a sentir o bom disso e quando me faz arrepiar com desejos impossíveis que eu percebo quem sou. Que eu percebo quem era e em quem me tornei com o sofrimento, é daí que tiro todas as lições de vida, e esclareço todas as dúvidas e porquês existentes. É nesses momentos que eu deixo de acreditar nesta dor constante, e passo a viver um dia do que realmente me dá vontade de viver, que sonho com o que realmente quero sonhar e sorrio com o verdadeiro sorriso.
O pior das boas recordações, é que são maus momentos. Depois de nos entregarmos novamente a estes pensamentos, depois de nos deixarmos levar por eles como se fossemos crianças, e por mais que a cabeça proíba, o coração autoriza, depois de deixarmos novamente escapar a saudade de dentro da gaiola, vem a parte mais difícil. A parte em que temos que voltar a empurrar para dentro da enorme ferida aberta no fundo do nosso ser toda a felicidade, que por mais que nos faça sorrir, não nos faz viver. Temos que voltar ao mundo real, ao verdadeiro e ao presente, temos que nos voltar a mentalizar que o que procurávamos, já encontramos e deixamos para trás, e que aquilo que devemos procurar agora é algo mais forte, que nos dê a força de tapar a ferida. Tapa-la, porque cura-la é algo que o próprio sonho não consegue fantasiar a esse ponto. Uma ferida aberta no coração, é uma dor infinita que apenas pode ser diminuída. Quando nos prendemos demasiado a uma coisa, sem conseguir ver o que está por detrás desta, estamos a permitir que deixemos de ser nós, para deixar algo fazer parte de nós, e quando esse algo se vai, não tira tudo o que um dia encheu dentro de nós.
A pior parte, é voltar a fechar a gaiola, para um dia novamente, deixarmos a chave algures à frente de quem a quer abrir, com a desculpa de que a perdemos, para podermos arranjar uma desculpa para a nossa fraqueza.

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